Autenticidade e aprendizagem
ENTREVISTA A MARTIN MOSTBÖCK, ARQUITECTO E DESIGNER QUE ATRAVESSANDO DIFERENTES ESPÍRITOS DE ÉPOCAS MANTÉM O CARÁCTER NA CONSTANTE APRENDIZAGEM, A QUALIDADE NA EXECUÇÃO E UMA SÁBIA SÁTIRA À NATUREZA HUMANA.
Entrevista: Tiago Krusse
Fotografia de abertura de Martin Mostböck é da Eternit
Quais foram os elementos mais importantes da sua infância e os ensinamentos que lhe permitiram estruturar o seu pensamento e objectivos na vida?
Fragmentos de matemática, geometria e esboços, “aprender fazendo” e “tentativa e erro”.
Como descreve a atmosfera que viveu no ambiente universitário em Viena e como caracteriza o ensino da arquitectura ?
No início dos anos 80, a atmosfera no ambiente universitário era muito escabrosa, envelhecida, por vezes aborrecida e a caminho de ser Pós-Moderna. No início dos anos vinte, como descobri mais tarde, estávamos na encruzilhada de um novo, moderno, jovem e pouco convencional espírito arquitectónico e de design. Mas como na vida, antes de se gostar realmente de algo, é preciso transcender as estruturas existentes, antigas, para explorar as novas estruturas.
Como é que se junta à cooperativa de arquitectos Coop Himmelblau liderada por Wolf Dieter Prix?
Conheci-o durante uma das suas palestras no Museu de Artes Aplicadas de Viena e pedi-lhe um estágio. Ele respondeu-me que era como trabalhar para o Le Corbusier, teria de pagar para trabalhar para o CHBL. Então disse-lhe obrigado, virei-me e quando estava prestes a ir embora ele parou-me e disse-me que era uma piada, que eu devia trazer a minha carteira para o escritório. Alguns meses depois comecei a trabalhar no seu escritório.
Nas quase duas décadas a trabalhar para a Coop Himmelblau, o que mais o marcou em termos pessoais e profissionais?
Trabalhar com esboços e em modelos de trabalho… em etapas e progressos, desde o primeiro esboço inicial até ao plano e detalhes finais, para o projecto final … e ser inabalável na defesa das próprias ideias, sempre aberto à discussão, não importa o quê.
A arquitectura serve o Homem ou os arquitectos lucram com a arquitectura?
A arquitectura serve o Homem e os arquitectos beneficiam da arquitectura, é uma história interminável. Sem desequilíbrio, sem progresso, sem desenvolvimento, a arquitectura morrerá de tédio! O que acontece durante todo o dia em muitos exemplos banais.
O que o leva a abrir em 2001 o seu próprio estúdio?
Consegui o meu primeiro contrato para uma cadeira, “Garcia”, a ser produzida em série. Após algumas semanas perguntei ao CEO da empresa de produção, o senhor Gneisz, quanto tempo o Garcia ficaria em produção? Ele respondeu: senhor Arquitecto, estará terminado dentro de 3 ou 4 anos. Felizmente ele estava errado e a Garcia continua ainda hoje no programa e está a vender-se bem.
Quais são as vantagens e desvantagens de trabalhar apenas para si?
Trabalho sozinho e em colectivo. Para o meu pequeno projecto arquitectónico prefiro trabalhar a solo -como o alpinista sozinho pelos trilhos- e nos projectos de grandes dimensões com parceiros, numa parceria criativa.
De todos os seus projectos de arquitectura quais aqueles que mais o satisfizeram?
Quanto aos pequenos projectos, o último que terminei foi “Room with a View”, um pequeno projecto residencial numa pequena aldeia perto de Viena. Em termos de grandes projectos foi o “Living Garden Project”, um projecto de habitação de uso misto que concebemos no Seestadt Aspern, um dos maiores projectos de desenvolvimento urbano da Europa. Está localizado na parte nordeste de Viena.
O seu espírito leva-o ao design do produto e mais além. O que despertou o seu interesse?
Estava sempre a fazer experiências com o que quer que fosse. Lembro-me de construir uma lâmpada a partir de um frasco de compota com uma tampa cheia de pirilampos. Devia ter nove ou dez anos de idade. Uma ideia louca! Funcionou, quando agitei o frasco os pirilampos começaram a brilhar. Algo de sustentável mas no final ia contra o bem-estar animal e por isso libertei-os.
No domínio da concepção de produtos, quais foram os desafios que exigiram mais de si?
Penso que se trata de conceber luz porque é um material que não se pode sentir, cheirar ou saborear. O tipo com quem gosto sempre de desenhar luz é o “Maestro da Luz” Mario Nanni, o fundador da lendária empresa Viabizzuno, de Bolonha. Conheci-o no seu laboratório na semana passada para continuar a desenhar uma família de luzes chamada Eklipse. Começámos com um candeeiro de chão, antes da pandemia, e agora queremos desenvolver ainda mais a família com um candeeiro de parede e uma versão de mesa.
Que importância tem para si ver o seu trabalho reconhecido e exposto em locais de excelência?
Essa é sempre uma importante referência do meu trabalho para o utilizador e para o mercado. Além disso, é também uma plataforma importante para eu mostrar o meu trabalho especial, que é criado como peças individuais e se encaixa mais numa arte do que num contexto de design. Como, por exemplo, na exposição “The Chairman”, apresentada no Design Forum Estíria, em Graz. Tenho a oportunidade de mostrar cadeiras, produzidas em massa como a “Garcia” e a “Konstantin” e outras especiais como a “The Best Friend’s Chair”.
É mais fácil aprender ou ensinar?
Para mim? Descobri que é mais fácil aprender.
O seu envolvimento pessoal e profissional com pessoas ligadas às Indústrias Criativas da Estíria é público. A que se deve esta relação de amizade e respeito?
Esta colaboração existe há vários anos e o que começou como um primeiro pequeno projecto transformou-se numa forte parceria, dando origem a cada ano a um novo projecto inovador que desenvolvemos. Ao longo dos anos, as relações e amizades desenvolveram-se com muitas pessoas nessa organização, incluindo a Barbara Nussmüller, a Stefanie Falle e, claro, o director Eberhard Schrempf.
Ao cinismo existente no seu ambiente profissional, responde com humor e sátira contundentes. Qual é a razão para isso?
É sempre mais fácil arranjar uma resposta fantástica com humor e um piscar de olhos do que cínica… porque os cínicos normalmente não têm imaginação.
Os mais prestigiados prémios de arquitectura e de design reconhecem a qualidade do seu trabalho. O que significam eles para si?
Muito!
O que é para si o bom design?
O bom design para mim é auto-explicativo e inesperado.