Ideias traduzidas em papel
Entrevista a Alexia de Ville, artista visual e cenógrafa de formação, que nos conta como criou a sua marca e o que todo esse percurso tem significado em termos de realização pessoal. Diz-nos o que a move no seus processos criativos e que novas pesquisas encetou com o propósito da sustentabilidade e responsabilidade ambiental.

Entrevista de Tiago Krusse

Fotografia: Retrato de Alexia de Ville por Christophe Coënon e outras fotografias uma cortesia de Tenue de Ville


O que é que define o conceito da marca Tenue de Ville?

Curiosidade, paixão e harmonia são as palavras que melhor definem a minha marca. Em cada desenho, o meu objectivo é criar algo novo, ousado e harmonioso.

Quem cria e como são desenvolvidas as colecções?

Sou eu quem desenvolve todas as colecções da Tenue de Ville. Em geral, parto de uma ideia para um tema e começo por procurar imagens inspiradoras, que reúno sob a forma de mood boards. As imagens que recolho podem vir do mundo da arte, do design, da ilustração, da fotografia, etc. Também gosto de retirar pedaços de imagens de revistas, que depois trabalho sob a forma de colagens. Gosto de traduzir as minhas ideias em diferentes suportes, sejam eles o desenho, a pintura, a gravura, a colagem ou uma mistura de várias destas técnicas. Uma vez terminado o desenho, passo à coloração. Harmonizo sempre as minhas cores digitalmente, depois de o desenho ter sido digitalizado. Procuro as harmonias de cores intuitivamente, inspirando-me nas tendências actuais. Depois de ter criado cerca de vinte desenhos, vejo como se juntam para formar uma história coerente. Muitas vezes, descarto alguns porque o seu tema ou tratamento não se enquadra no resto da colecção, mas isso não significa que não venham a ser incluídos noutra futura!


No processo que parte da ideia, à produção e à comercialização, quais são os princípios e as etapas que definem e distiguem a obra?

Uma vez criados os vários panoramas da colecção, é altura de fazer alguns testes de impressão e escolher o papel e as cores para cada um deles. O catálogo é a imagem da marca nas lojas que nos representam. Quando os catálogos estão prontos, apresentamos as colecções em feiras como a Maison & Objet, em Paris, e depois contactamos as lojas com quem trabalhamos para lhes apresentar os novos produtos.

Pormenor da colecção Alchemy, apresentada em exclusivo na edição de Janeiro da Maison & Object, em Paris, França.

Onde é que começou a imaginar este percurso artístico e profissional?

Formada como artista plástica, foi alguns anos depois de terminar os meus estudos que comecei a aprender a criar padrões. Inicialmente aplicados ao vestuário, alarguei os meus horizontes encomendando a impressão de têxteis para mobiliário, artigos de papelaria e, finalmente, papel de parede. Senti que este meio tinha muito potencial e que estava lentamente a voltar à moda. Foi em 2015 que decidi concentrar-me neste meio e desenvolvi principalmente desenhos em grande escala sob a forma de frescos. Gostei do meu toque artístico e da minha sensibilidade. Rapidamente desenvolvi colecções originais que vendo numa dúzia de países na Europa, Ásia e até na Austrália.


Que ferramentas é que a escola e outros estabelecimentos de ensino lhe deixaram?

Estudei numa escola onde a multidisciplinaridade estava no centro do currículo, o que significa que, embora nos fossem dadas determinadas matérias, era-nos sempre dada a possibilidade de escolher o meio para realizar o exercício.
As minhas colecções de papel de parede permitem-me precisamente esta liberdade de meio. Posso trabalhar com uma linha em desenho, depois misturar essa linha com uma textura feita em gravura e, finalmente, adicionar cor com um pincel. Ou posso simplesmente decidir usar uma flor, secá-la, prensá-la e fotografá-la. Gosto de misturar todas estas técnicas na minha pesquisa gráfica.

Como é que analisa o seu espírito criativo ?

Gosto de me reinventar em cada colecção. Gosto de fazer coisas novas que não se vêem em lado algum. Gosto de ser vanguardista e ousada na minha composição, na minha técnica e nas minhas propostas criativas.

Colecção Ode

Como é que a marca se posiciona em relação ao mercado e que factores considera fundamentais para a estratégia comercial?

A Tenue de Ville é uma marca de luxo. Vendemos as nossas colecções através de pontos de venda, trabalhamos com arquitectos e designers de interiores e promovemo-nos através das redes sociais e da imprensa.

Que práticas adoptaram em matéria de economia circular e de responsabilidade ambiental?

Todas as nossas criações são produzidas apenas por encomenda, desde 2019. Isto evita a necessidade de grandes espaços de armazenamento mas também o risco de ter de deitar fora os artigos não vendidos no final da validade da colecção. Assim, todas as nossas referências estão disponíveis sem limite de tempo ou de validade. Oferecemos todas as nossas criações à medida, para evitar ao máximo o desperdício de papel de parede.
Desde 2020, tenho também tentado criar um revestimento de parede reciclado, utilizando restos de papel de parede das minhas produções. Esta pesquisa ainda está em curso, e mostrei os primeiros protótipos na exposição Maison & Objet.

Colecção Poème

O que lhe traz realização pessoal?

Estar à frente de uma empresa, mesmo de uma empresa criativa, significa usar diferentes chapéus. A fase criativa é obviamente a que mais me agrada, é a parte do meu trabalho que mais me alimenta. Quer se trate de procurar inspiração ou de passar à criação propriamente dita, adoro trabalhar com as minhas mãos, pintar, desenhar, etc. A parte que julgo dominar melhor -porque são os elogios que recebo com mais frequência- é a harmonia das cores. O momento em que estou à procura da combinação de cores é um verdadeiro momento de meditação, durante o qual o tempo se desvanece para mim. É toda esta fase que me faz desabrochar profundamente.

O que significa para si a beleza?

Para mim, a beleza não é suave, vem da experimentação. A beleza é a harmonia. A beleza está em constante mudança.

Colecção Spice
Colecção Alchemy

Mais informação em https://www.tenuedeville.com/fr/

Alexia de Ville


Fundou em 2014 a Tenue De Ville, uma marca belga de papéis de parede. É no seu estúdio em Bruxelas, na Bélgica, que decorre o processo criativo para conceber e harmonizar padrões, texturas e paletas de cores.

A cada colecção, impressa principalmente à maneira antiga -rolos de cobre fotogravados-, a mentora da Tenue De Ville pretende mudar o seu processo tradicional, abordando novos suportes: desenho, fotografia e pintura para complementar a sua abordagem e conhecimento.

Faz pesquisa artística utilizando todas as técnicas como a gravura, a tecelagem e a dobragem de papéis, as tinturas de materiais. Tudo isso constitui o fio condutor nas criações, ora poéticas ora gráficas.

O desenho à mão é fundamental para si, para a marca, e a abordagem humana e os acidentes aleatórios são fomentados.

Supervisiona cada etapa da produção com grande atenção e apresenta cerca de quinze modelos por colecção, disponíveis em várias cores.

A designer belga desenvolve e pesquisa temas que lhe são caros como o mundo animal e orgânico, composições ilustrativas ou motivos geométricos.

Como gestora da marca preocupa-se com o ambiente e apoia a produção local. Os rolos de papel de parede são impressos na Bélgica, em conformidade com as normas ecológicas. As tintas utilizadas são à base de água e o papel tem certificação FSC, para garantir a gestão sustentável das florestas.