A arquitectura que é verdadeira
Maria João Correia é arquitecta e directora executiva da Segmento Urbano, recentemente distinguida no World Architecture Festival pelo projecto Echoes of the Void com o prémio WAFX 2025, na categoria “Ageing and Health“. Deste projecto pensado para a singularidade das Furnas, na ilha de São Miguel, nos Açores, e o fim de vida, partimos para uma conversa profunda sobre o estado da arquitectura e o humanismo da sua essência que se perdeu com o tempo.

Entrevista por Tiago Krusse
Imagens e fotografias: Cortesia do Segmento Urbano. Fotografias de abertura da autoria de Francisco Miranda -Yank Media.

Maria João Correia, arquitecta da Segmento Urbano. Fotografia de Francisco Miranda -Yank Media.

“A Arquitectura serve o Homem” é uma frase que se encontra inscrita na sede da Ordem dos Arquitectos em Lisboa. O que é a Arquitectura do Ser designada por si e dentro do atelier Segmento Urbano?

A arquitectura é, para mim, uma disciplina humanista. Nasce de uma necessidade profundamente humana – o abrigo – e, por isso, deve sempre servir o homem no seu ser e no seu fazer.

Sempre me intrigou a razão pela qual a arquitectura se foi afastando dos seus princípios fundadores e passou a ser movida por lógicas alheias à sua essência. Mesmo hoje, com mais respostas técnicas e tecnológicas do que nunca, continuo a investigar como manter a arquitectura fiel à sua dimensão humanista.

Às vezes, o mais difícil é compreender o que realmente significa “ser humano”. Ficamos tão concentrados em cumprir o papel de servir o outro dentro das regras e funções que nos cabem, que esquecemos de atender à sua essência e às suas necessidades mais profundas — necessidades que, por vezes, a própria pessoa já perdeu de vista.

A Arquitectura do Ser, quase como uma antítese da arquitectura de autor, não é sobre o ego de quem desenha, nem sobre nenhum dos arquitectos da Segmento Urbano, mas sim sobre as pessoas que vão habitar determinado espaço, a sua identidade, como vivem, sentem e se apropriam do espaço que projectamos. Tudo isto sem nunca esquecer as pessoas que o constroem.


A Arquitectura do Ser é, no fundo, um reencontro entre a técnica e a essência, num só lugar, um exercício de escuta profunda e de criação com sentido.

Quem são os agentes que definem o edificado e quais os valores que nunca abdicam nos vossos compromissos?

Vivemos numa era em que parecem ser sobretudo agentes externos à arquitectura – a economia, o mercado, a banca e a legislação – a definir o que se constrói. Mas, continuo a acreditar que cabe ao arquitecto devolver à disciplina o seu papel de mediação e consciência.

Portugal tem uma tradição arquitectónica forte, mas também uma rigidez que, com o tempo, afastou a arquitectura das pessoas. Essa distância abriu espaço para que outros agentes tomassem conta do assunto e, assim, surgiu uma arquitectura de sobrevivência muitas vezes sem alma.

Na Segmento Urbano, nunca abdicámos da ideia de que a arquitectura é uma disciplina humanista, que não se deve submeter a princípios alheios à sua natureza. Tem de evoluir e adaptar-se, sim, mas sem perder a ética e o compromisso com o humano, e é esse o nosso maior valor.

Onde é que a Arquitectura pode e deve contrariar a voracidade do novo e a ganância dos negócios imobiliários?

Não creio que a arquitectura deva contrariar, penso que deve educar e, para isso, tem também de aprender. Tem de falar a mesma língua de quem hoje domina o território, ou seja, o mercado, o investidor, o promotor e as pessoas que com pressa querem investir ou querem um sítio para morar.

Para educar, e mesmo para conseguir comunicar, é sempre preciso perceber a necessidade do outro, que é o que a arquitectura não faz, ainda. Educar é conseguir comunicar sem perder profundidade, perceber o valor do outro lado da mesa e transformar o diálogo em entendimento, pelo que, acredito que é isso que falta muitas vezes. A arquitectura precisa de aprender a dialogar com o capital sem se perder nele e, para isso, creio que também é necessário que a arquitectura e os arquitectos estejam dispostos a aprender a linguagem do mercado, que fala de rentabilidade, de custo, de ROI e CAPEX.


A arquitectura precisa de voltar a ocupar o seu lugar como mediadora entre o capital e o humano, a terra e a inteligência e a arte e a economia. Não através da oposição, mas da tradução, traduzindo valores de bem-estar, equilíbrio, verdade e consciência em métricas de sustentabilidade e impacto real.

O Land Staging™ nasceu precisamente do entendimento de que não basta projectar espaços, é preciso criar modelos de valor onde ética, rentabilidade e consciência coexistem, recolocando a arquitectura no centro da estratégia e do processo.

Quando a arquitectura demonstra que o que é bom para as pessoas também é bom para o negócio, deixa de ser utopia e passa a ser valor acrescentado.  O arquitecto é, mais do que nunca, um tradutor entre mundos que há demasiado tempo deixaram de se ouvir.

Quando fundou a Segmento Urbano, em 2006, quais foram os maiores desafios para a empresa crescer e preservar a sua filosofia de trabalho?

Quando fundei a Segmento Urbano, em 2006, acreditava — talvez de forma ainda inocente — que a arquitectura tinha de ter alma e propósito, mas que deveria ser, inevitavelmente, reflexo do seu tempo.


Talvez por causa da minha formação e dos contactos que fui tendo ao longo do percurso, sempre percebi a arquitectura como uma ferramenta de investimento e, portanto, sempre a vi também ligada à linguagem económica.


Desde cedo senti, também, que a arquitectura é uma disciplina de imenso poder e, por consequência, de grande responsabilidade. Acredito que a responsabilidade do arquitecto não deve terminar no projceto, deve estar presente nas mãos de quem o põe de pé, e na vivência de quem o habita.

Nunca fizemos um projecto em Portugal sem querer saber das mãos que o tornam real, as pessoas que constroem, que moldam e que dão corpo ao que imaginamos. É nelas que reside grande parte da ética e da verdade da construção.

Os maiores desafios foram, e continuam a ser, crescer sem perder a alma e o propósito. Num sector dominado pela pressa e pela lógica financeira, preservar a coerência entre intenção, ética e rentabilidade exigiu-me aprender a fazer pontes entre o idealismo e a gestão, o sonho e o orçamento, e entre o humano e o económico.

No fundo, a Segmento Urbano nasceu do desejo de provar que é possível fazer arquitectura com alma, construir com consciência e liderar com humanidade, sem abdicar de resultados, mas também sem trair a essência.

Como pode a ética fazer caminho num mercado pautado por uma grande agressividade, uma competitividade baseada na reputação e formas desleais de ganhar concursos?

A ética é, paradoxalmente, o que mais distingue e o que mais desafia quem trabalha neste sector.

Vivemos num mercado onde o curto prazo e a visibilidade fácil parecem valer mais do que a consistência ou o serviço real prestado às pessoas. Mas, acredito que a ética é, em última análise, uma estratégia de longo prazo, o verdadeiro capital reputacional.

Ao longo destes quase vinte anos, percebi que a ética não é um ideal romântico, mas sim uma ferramenta de gestão. É o que nos permite dizer “não” a projectos desalinhados, mesmo quando seriam financeiramente vantajosos, e o que nos leva a atrair clientes e parceiros que partilham da mesma integridade.

Na Segmento Urbano, a ética não é um adereço, mas um critério operativo. Está presente na forma como comunicamos, contratamos, orçamentamos e construímos. Ser ético é ser transparente, e ser transparente é ter coragem de mostrar o que custa, o que demora e o porquê das decisões.

Num mercado onde nem sempre os valores são partilhados, manter a integridade é um exercício diário. Mas é também o que nos permite dormir em paz e continuar a crescer de forma verdadeira.

Acredito que, à medida que o sector amadurece, a reputação ética será o novo luxo. E essa mudança já começou com os clientes mais conscientes, os investidores mais atentos e as novas gerações que reconhecem o valor da confiança como algo que não se compra, apenas se constrói. Por proteção não fazemos concursos públicos nem construímos hoje projectos que não sejam da nossa autoria

Por que é tão importante a metodologia Building Information Modeling (BIM)?

A Segmento Urbano nasceu com o BIM, não o adoptou por tendência ou por obrigatoriedade, mas porque desde o início acreditou na integração total entre projecto e construção. Esta metodologia minimiza processos imensamente repetidos, com enorme potencial de erro humano, em ferramentas de desenho bidimensional, como o AutoCAD, que nada mais é do que a forma convencional de comunicar desenhos num computador.

O BIM é a criação do modelo virtual em vez da sua representação, é um asset de pensamento valiosíssimo porque conseguimos “ver” tudo em tempo real. A nossa mente é falível e o BIM reduz imenso os erros e incompatibilidades de projecto.

A nossa forma de trabalhar sempre foi colaborativa, multidisciplinar e ancorada em dados reais.

Ou seja, o BIM, para nós, nunca foi apenas uma ferramenta digital, foi sempre uma forma de pensar arquitectura de forma transparente, integrada e responsável. Permite prever o que antes era corrigido em obra, reduzir desperdícios e alinhar todos os agentes à volta de um mesmo modelo de verdade.

Num sector onde ainda se vive uma “crise silenciosa” de descoordenação, atrasos e falta de qualidade, o BIM representa uma nova ética ligada à clareza, eficiência e responsabilidade partilhada.

Mas usar BIM não significa abdicar do traço à mão. Continuamos a desenhar em cadernos, com caneta Bic, porque é aí que nasce o pensamento livre, através do gesto intuitivo construímos o modelo digital. O BIM começa na ideia e termina na obra, torna-se na ponte entre o humano e o tecnológico, bem como, entre a imaginação e o real.

Nos Países Baixos, por exemplo, o BIM já é utilizado para automação da construção, com máquinas que executam alvenarias a partir de modelos digitais transformando-se numa prova de que a tecnologia pode amplificar a precisão sem eliminar o papel humano.

Em Portugal, ainda há quem veja o BIM como uma exigência a cumprir, quando na verdade é um enorme activo estratégico, um instrumento de pensamento, de compatibilização técnica e de redução de custos de obra, pelo que, ignorar estes instrumentos é perder competitividade e desperdiçar o poder transformador de uma arquitectura bem coordenada.

Para a Segmento Urbano, o BIM é o que garante que a ideia e a execução falam a mesma língua, além de ser uma ferramenta de comunicação com enorme poder para o cliente. É tecnologia ao serviço da integridade e este é, desde sempre, o alicerce da nossa arquitectura.

Naqueles que são os objectivos para um desenvolvimento sustentável, quais as práticas levadas a cabo pela empresa?

A sustentabilidade para a Segmento Urbano nunca foi uma tendência, foi sempre um princípio de verdade.

Antes de se falar em ESG (Environmental, Social and Governance) já praticávamos o que hoje se procura definir, ou seja, ética ambiental, responsabilidade social e integridade na gestão. A dimensão ambiental começa pela consciência e pelo tempo, escolhemos materiais duráveis, privilegiamos fornecedores locais e promovemos soluções energéticas eficientes e regenerativas. Mas, mais do que isso, acreditamos no princípio de construir menos, mas melhor. Cada edifício deve justificar a sua existência, respeitar o território e deixar um legado positivo. O BIM é um instrumento essencial neste processo, reduzindo erros, desperdícios e incompatibilidades, tornando a construção mais eficiente e sustentável.

A dimensão social é, para nós, central. As pessoas que constroem são tão importantes como as que habitam. Daqui nasce o Build Lab, um programa criado pela Segmento Urbano para qualificar, valorizar e dignificar a mão-de-obra da construção civil, em Portugal e nos países de origem de muitos trabalhadores migrantes. Acreditamos que a transformação do sector começa por quem o executa, e que a ética humana é o verdadeiro alicerce da sustentabilidade.

No governo das decisões, somos guiados por ética, clareza e responsabilidade económica. Recusamos atalhos, cultivamos transparência e praticamos uma liderança humana, firme e consciente. A sustentabilidade não é apenas ambiental, é também financeira e emocional. Ser sustentável é garantir que a empresa, as pessoas e o território crescem juntos.

A Arquitectura do Ser é, no fundo, a nossa tradução poética do ESG. É ver o edifício como um organismo vivo, um espaço que respira, sente e impacta quem o habita e quem o constrói. É devolver à arquitectura o seu papel original, o de servir a vida.

Para a Segmento Urbano, a sustentabilidade é o ponto onde a ética encontra a beleza. Não é um selo, é uma forma de estar no mundo.

Echoes of the Void, distinguido no World Architecture Festival, com o prémio WAFX 2025, na categoria “Ageing and Health” e que para Maria João Correia “tem um sabor ainda mais especial, uma vez que o mesmo confere visibilidade ao nosso posicionamento enquanto atelier atento às questões contemporâneas da arquitectura e capaz de propor soluções que cruzam inovação formal, sensibilidade poética e responsabilidade social”.

De que forma encaram o reconhecimento dado ao vosso trabalho em Portugal e no estrangeiro?

O reconhecimento internacional que a Segmento Urbano tem conquistado nasce, paradoxalmente, do facto de não pensarmos de forma comum em Portugal.

Sempre procurámos questionar o óbvio, integrar o lado humano no processo e olhar para a arquitetura como um sistema vivo técnico, económico e emocional.

Enquanto muitos ainda separam o que é “projecto” do que é “construção”, nós acreditamos que só há coerência quando o pensamento e a execução caminham juntos. Essa visão integrada, ancorada na ética e na verdade construtiva, tem despertado atenção lá fora, precisamente porque não é formatada nem defensiva é livre, mas rigorosa.

O reconhecimento, para nós, é consequência de coerência. Não nasce da intenção de ser diferente, mas de permanecer fiel àquilo em que acreditamos, nomeadamente, que a arquitectura deve servir o ser humano e o território com inteligência, presença e verdade.

O Echoes of the Void, para lá da distinção pelo World Architecture Festival 2025 entre os 28 projectos considerados mais visionários do mundo, faz uma abordagem pioneira ao fim do ciclo de vida. Que elementos construtivos foram tomados em consideração e como é que procederam às escolhas que adoptaram para o projecto?

O Echoes of the Void nasceu de uma pergunta simples e incómoda: como projectar para o fim da vida, quando a arquitectura evita falar da morte?

O projecto é uma jornada arquitectónica pelas fases do luto, inspirada no modelo de Kübler-Ross e na visão de Eckhart Tolle, de que cada etapa é uma forma de resistência ao presente. Mais do que uma sequência linear, o percurso é uma paisagem emocional onde a matéria e a luz refletem a transição interior de negação, raiva, negociação, depressão e aceitação.

A escolha dos materiais foi guiada pela verdade do lugar. Nas Furnas, a terra fala através da pedra, do vapor e da água. Por isso, recorremos a materiais locais, como o basalto e sulfur-infused concrete, para traduzir a densidade, a erosão e a energia subterrânea que marcam o território. Cada material é uma metáfora, desde o basalto, pela sua memória e permanência, ao betão sulfurado, pela sua resistência e renovação, sendo uma matéria que vive e respira o ciclo de destruição e renascimento.

O Echoes of the Void é um projecto conceptual, mas profundamente humano. Convida-nos a caminhar pelo silêncio e pela consciência, onde o fim é apenas a forma que a vida encontra para se transformar. É, de certa forma, o primeiro teste para uma arquitectura que cura o próprio, que reconhece a dor, transforma-a e regressa à vida mais completa. Em Portugal, gostaria de ver essa coragem aplicada à arquitectura hospitalar e do fim de vida, porque o fim faz parte da vida, e também merece ser desenhado com dignidade, luz e presença.

Como olha para os novos passos dados pela neuroarquitectura e pelo design biofílico?

A neuroarquitectura e o design biofílico não são tendências, são absolutamente essenciais. A arquitectura tem impacto directo na forma como as pessoas se sentem, se relacionam e vivem nos espaços. Não há neutralidade possível, cada decisão espacial, material, luz ou proporção influencia o corpo e o estado emocional de quem habita.

A Arquitectura do Ser nasce dessa consciência. É uma arquitectura mais centrada no que as pessoas são, na sua essência enquanto seres humanos, do que no que fazem. Não se trata de desenhar para a função, mas de desenhar para a vida interior, para a emoção e para a presença.

Na minha opinião, todas as habitações deviam incluir espaços pensados para neutralizar emoções menos boas, como a tristeza, a raiva ou a necessidade de introspeção. Se cada ser humano tivesse um espaço seguro para simplesmente sentir e recentrar-se, acredito que viveríamos em sociedades muito mais equilibradas.

O design biofílico aproxima-nos da natureza exterior, a neuroarquitetura aproxima-nos da nossa natureza interior, logo, quando as duas dimensões se encontram, o espaço torna-se um mediador vivo entre o humano e o invisível e as pessoas sentem-se bem, muitas vezes mesmo sem saber porquê.

Echoes of the Void.

O que estão a desenvolver no Build Lab, como uma plataforma educativa e um laboratório de formação? Quais são os principais objectivos do projecto?

O Build Lab nasceu das mãos que constroem a arquitectura. O que os nossos colaboradores sabem hoje, fruto de 30 ou 40 anos de experiência em construção civil, que é um património vivo de enorme valor, muitas vezes invisível e subestimado.

Durante décadas, ouviu-se em Portugal a frase “se não estudas, vais para as obras”. O resultado é visível e, hoje em dia, ninguém quer trabalhar nas obras. Mas a verdade é que o sector da construção é um lugar de inteligência prática, precisão e saber acumulado.

No Build Lab juntamos a alta tecnologia do BIM à verdade crua da obra real, num espaço onde o digital e o humano coexistem. O objectivo é formar e dignificar, transformar a percepção social do sector, dar-lhe o valor que merece e preparar uma nova geração de profissionais da construção civil.

Mais do que um projeto de formação, o Build Lab é a missão de criar uma imagem diferente do sector, unindo conhecimento, ética e futuro, porque construir continua a ser, antes de tudo, um acto profundamente humano.

O que é boa Arquitectura?

A boa arquitetura é a que faz sentido para quem a vive, para quem a constrói e para o lugar onde existe. Não é sobre forma ou estilo, mas sobre verdade e presença.

Boa arquitectura é a que eleva quem a faz, quem a habita e quem a contempla. A que nasce de uma intenção clara, de uma escuta profunda, e que devolve ao mundo algo de íntegro, humano e duradouro. Para mim, boa arquitectura é a que cura o espaço, o tempo e as relações, a que se sustenta na ética e não na vaidade, que é generosa sem precisar de o afirmar. No fundo, é a que não envelhece porque é verdadeira.
Fica, transforma, acolhe e inspira. No seu tempo e para além dele.

Echoes of the Void.
Echoes of the Void,
Echoes of the Void,
Echoes of the Void.
Echoes of the Void.
Echoes of the Void.

Maria João Correia


Maria João Correia nasceu em 1981, em Guimarães, numa casa onde os valores não se ensinavam — viviam-se. Cresceu entre duas formas de estar no mundo: a disciplina silenciosa de um lado, a visão intuitiva e ampla do outro. Nesse contraste, aprendeu a pensar pela sua cabeça, a não fugir da exigência e a escutar antes de decidir. É dessa base que nasce a sua arquitectura: ética, sensível e profundamente comprometida com quem a habita.

Desde cedo revelou fascínio por construir, inventar soluções e criar mundos: jogava SimCity num portátil Amstrad dos anos 80, sonhava com fazer e gerir cidades, e passava os verões a construir barcos idealizados pelo pai.

Concluiu o ensino secundário em Guimarães e, ao contrário do que muitos esperavam — especialmente tendo o pai Médico —, escolheu arquitectura. A decisão surgiu depois de uma viagem sozinha a Londres, com apenas 15 anos. Entre museus, ruas e galerias, percebeu com clareza que a arquitetura podia ser tudo o que procurava: liberdade, expressão e verdade. Ali começou a sua própria fundação.

Entrou na FAUP, mas escolheu estudar em Londres, na University of Westminster, onde teve contacto directo com figuras como Zaha Hadid, Peter Cook, David Greene, Pete Silver e Kate Heron.
Recebeu uma bolsa de intercâmbio para o RMIT – Royal Melbourne Institute of Technology, na Austrália, uma das experiências mais marcantes da sua formação. Foi ali, num contexto multicultural e altamente experimental, que mergulhou na vertente mais exploratória da arquitectura — aquela que questiona, propõe e arrisca. A vivência em Melbourne ampliou a sua visão sobre o papel do arquitecto no mundo, reforçando o desejo de criar espaços com alma, sentido e impacto real na vida das pessoas.
De regresso a Londres trabalhou no prestigiado atelier Donald Insall Associates, especializado em conservação e património, onde colaborou em projetos já em ambiente BIM (Building Information Modelling).

Em 2004, regressa a Portugal. Colabora com ateliers de arquitectura no Porto e em Lisboa, onde aprofunda diferentes abordagens de projecto. Integra também equipas técnicas especializadas em medições, orçamentos e apoio à execução, ganhando uma visão prática e integrada da arquitectura.
Em simultâneo, conclui uma segunda licenciatura em Arquitectura na Universidade Lusíada, já enquadrada na transição para o modelo de Bolonha, com a tese de Mestrado sob a orientação da Prof.ª Dr.ª Cristina Caramelo Gomes, intitulada “As novas tecnologias na criação de um novo paradigma da urbanidade”.

Em 2006, funda a Segmento Urbano, um atelier multidisciplinar que integra arquitectura, construção e transformação. O seu trabalho pauta-se pela visão da Arquitectura do Ser, centrada na escuta profunda, na intenção projectual e na criação de espaços que respeitam a necessidade e a identidade de cada desafio.

Ao longo de quase duas décadas, liderou projectos em Portugal e Angola, conciliando várias tipologias, investimento, habitação e equipamentos, reabilitação e obra nova. A sua abordagem consciente e inovadora tem sido reconhecida nacional e internacionalmente, com destaque para a presença regular como finalista no World Architecture Festival, com projectos como o C-Spot, Metamorphosis, The Can, Porta do Vale e recentemente o Echoes of the Void além de finalista – vencedor do WAFX 2025, um projecto pioneiro pensado para espaços no fim de vida, que explora a arquitectura como sensorium e a dignidade emocional nos momentos de transição.

Não projecta segundo estilos correntes, tendências ou escolas. A sua arquitectura nasce do que é essencial — um reflexo genuíno da necessidade de quem a procura. Entre intuição, estética e técnica, cada traço resulta de uma escuta profunda. É essa escuta que estrutura o desenho e orienta a resolução de cada desafio, partindo da convicção de que a arquitectura tem o poder de fazer sentir — e, por vezes, até de curar.

Desde 2022, Maria João é também jurada do Festival Mundial de Arquitetura (World Architecture Festival), onde representa a abordagem ética, sensível e estratégica que desenvolveu no seu percurso.

É mãe de dois filhos, arquitecta, curiosa e exploradora da consciência. Acredita que a arquitectura é uma extensão do corpo e da alma e que só quando vivida com verdade pode ser verdadeiramente transformadora.

Hoje, lidera com presença, ética, sensibilidade e coragem com o desejo profundo de construir o invisível e deixar espaço para que cada ser humano possa viver verdadeiramente.

Segmento Urbano – https://www.segmentourbano.com