O saber fazer
ENTREVISTA A ALDA TOMÁS, DESIGNER SÉNIOR, DIRECTORA CRIATIVA DA MARCA VISTA ALEGRE ATLANTIS E RESPONSÁVEL PELO PROGRAMA DE RESIDÊNCIAS ARTÍSTICAS ID POOL. 

No momento em que celebra uma década de trabalho na Vista Alegre Atlantis, conversámos com Alda Tomás, designer sénior, directora criativa da marca e coordenadora da equipa de design e de ID Pool – programa de residências artísticas – sobre o universo de uma marca que carrega aos ombros a responsabilidade de preservar e de consolidar aspectos ligados ao património cultural e artístico de Portugal.

Texto: Tiago Krusse

Fotografias: Cortesia da Vista Alegre Atlantis

Toda a equipa tem uma perfeita noção da realidade e que não pode ser excêntrica nas abordagens a novos produtos

A equipa de design da Vista Alegre Atlantis é constituída por 12 designers e um elemento administrativo, que se ocupa mais com aspectos ligados a critérios de qualidade e certificados, libertando assim os criativos desse tipo de preocupações. O design e o marketing estão sob a mesma direcção, de Nuno Barra, que coordena a equipa de criativos, o e-commerce e toda a parte comercial que esteja relacionada com a marca, nomeadamente a comunicação. Existindo uma liberdade para criar, Alda Tomás sublinha que toda a equipa tem uma perfeita noção da realidade e que não pode ser excêntrica nas abordagens a novos produtos. Há uma necessidade de desenvolvimento de diferentes níveis de produtos, porque a marca tem um vasto e diversificado conjunto de gamas e todas elas com as suas especificidades artísticas e técnicas. Para lá da marca, também se desenvolvem produtos para a hotelaria e trabalhos que classifica de personalizações – feito à medida do cliente -, faceta que, por vezes, muitas pessoas e o mercado não se dão conta.  Há uma riqueza enorme quanto aos tipos de produtos, o que exige também uma necessidade de os pensar para diferentes níveis de mercado. E há também uma perfeita noção e interiorização de que a marca é património do Estado, carregando e protegendo todo um conjunto de valores e de conhecimentos ligados à herança cultural e artística portuguesa.

Cloudy Butterflies, colecção Única composta por duas jarras e um centro de mesa, por Claudia Schiffer

Não há na Vista Alegre Atlantis uma noção de luxo pretensioso e todos têm de ganhar no processo, a marca, quem produz e o consumidor


Olhando para a marca muitos dirão que ela não é acessível a todos mas Alda Tomás contrapõe afirmando que o que fazem é pensado na ideia de um luxo acessível. É esta a bandeira da marca no seu segmento premium. Há uma constante procura de oferecer um produto da maior qualidade possível e dá o exemplo dos novos têxteis, que espelham essa realidade. Produzidos na mesma fábrica em que se produzem peças para diversas marcas de luxo estrangeiras, e onde a Vista Alegre Atlantis processa com a mesma matéria-prima mas apresentando no final valores para venda mais baixos do que as concorrentes. Expressa que não há na Vista Alegre Atlantis uma noção de luxo pretensioso e todos têm de ganhar no processo, a marca, quem produz e o consumidor.


Blue Ming, vaso flores, pelo estúdio Marcel Wanders

A colecção têxtil é uma area de negócio nova, Alda Tomás explica que vem de uma necessidade da marca em abrir novos conceitos. Do mesmo modo em que marcas de moda entraram noutros segmentos de negócio, produzindo linhas para casa, também a Vista Alegre Atlantis decidiu fazer o inverso e esta linha de têxteis, composta de écharpes e mantas. É também uma prova da capacidade da marca em inovar e de competir. Dando como exemplo a linha de iluminação, esclarece que empresa não pretende ganhar o estatuto de especializada nessa área de negócio, há antes uma estratégia de fazer objectos de iluminação que tornem especiais os espaços onde irão ser enquadrados. Produções pensadas para o universo dos objectos de arte e que só podem ser encontradas na marca, com uma identidade única. Fazem parte de um conjunto de produtos com características especiais como é o caso dos candeeiros criados por Ross Lovegrove.
A Vista Alegre Atlantis é também sinónimo de charme. Alda Tomás remete-nos para a riqueza das decorações da marca, com uma paleta de cores muito grande, com muitos detalhes e que faz mais um elemento que a distingue dos outros. Os métodos de produção e toda uma herança acumulada de técnicas e do saber fazer, permitem que a marca atinja níveis de perfeição, de detalhe e de acabamento incomparáveis. No todo que é o grupo, constituído pela Vista Alegre, Bordalo Pinheiro, Casa Alegre e Cook & Serve, a produção é toda feita em Portugal.

Écharpe Duality, da linha de têxteis

O envolvimento com designers como Marcel Wanders ou Ross Lovegrove é traduzido, hoje, numa relação que vai para lá dos projectos realizados em conjunto

O trabalho da Vista Alegre Atlantis também integra convites feitos a designers estrangeiros e a necessidade de perceber como se dá todo esse processo é interessante pois que a marca tem uma identidade a defender e nessa relação com o criativo convidado há uma necessidade de estabelecer compromissos. Alda Tomás diz-nos que o convite a Marcel Wanders é um bom exemplo, reforçando a ligação da marca com os designers e vice-versa. Isso está bem patente na colecção Blue Ming, que traduz o espírito da Vista Alegre e que tem o cunho do trabalho de Marcel Wanders. Foi uma experiência muito positiva e Alda Tomás sublinha o profissionalismo de todos os designers e a sua capacidade de compreender os desejos da marca, até porque eles também são gente de negócios, que lideram equipas de alto nível técnico e humano. Conclui que tanto o envolvimento com designers como Marcel Wanders ou Ross Lovegrove é traduzido, hoje, numa relação que vai para lá dos projectos realizados em conjunto.  

O programa de residências artísticas, ID Pool, tem estado parado devido à pandemia relacionada com o Sars-CoV-2, mas é uma iniciativa que Alda Tomás também tem orgulho em mencionar. É um convite que a marca faz a cerca de 4 pessoas de cada vez, já tendo registado grupos superiores em número de participantes, sendo eles artistas de todo o mundo, e que passam cerca de um a três meses numa casa ao lado da fábrica. Nesse período de tempo há uma interação com a equipa, há visitas à fábrica, conversas com técnicos e os artistas dispõem de uma sala, perto do gabinete de design, onde desenvolvem as suas propostas. Há um acompanhamento pessoal de Alta Tomás bem como dos técnicos da Vista Alegre Atlantis. Consoante a avaliação das propostas, elas poderão passar para a modelagem e criação de protótipo, sendo finalmente apresentadas ao marketing para uma decisão sobre a inclusão na colecção. Diz-nos que já foram muitas as propostas que entraram para a gama da marca e que muitas delas têm ganho prémios internacionais.

Colecção Endangered tendo em primeiro plano a peça Gazela

O candeeiro Nervi, da colecção Earth to Humanity, por Ross Lovegrove

A Vista Alegre Atlantis tem sido reconhecida internacionalmente pela qualidade dos seus produtos e isso também é reforçado através de atribuições de prémios em reputadas competições de design no estrangeiro. Perguntámos a Alda Tomás se ela se apercebe das diferentes sensibilidades da avaliação nessas competições que enaltecem a cultura do bom design das boas práticas na disciplina. Ela não esconde que se apercebe das diferentes sensibilidades, como também já entende que cada produto proposto a concurso pela Vista Alegre Atlantis já é pensado no sentido de se aproximar ao espírito de cada uma dessas competições. Uma competição norte-americana e uma europeia têm inevitavelmente sensibilidades diferentes, o que também é positivo. A qualidade também é percebida de maneiras distintas.

Legenda

Alda Tomás


No seu percurso académico dividiu-se entre duas paixões, o design e a música. Licenciou-se em Design de Equipamento na Universidade de Belas Artes de Lisboa e frequentou o último ano do Curso de Piano no Conservatório Nacional de Lisboa.
Optou por seguir uma carreira como profissional do design. Iniciou a sua actividade trabalhando o vidro mas seria a porcelana a tornar-se o seu material de eleição.

Desde 2011 que trabalha para a Vista Alegre Atlantis, onde actualmente detém a posição de directora criativa do grupo, sendo também a responsável pelo processo de coordenação das residências artísticas, ID Pool.

Em 2009 recebeu a Menção Especial do júri no concurso nacional de design, o Prémio Sena da Silva, pela sua carreira profissional.

Os seus trabalhos têm sido distinguidos nos mais prestigiados prémios de design no estrangeiro, nomeadamente o German Design Award, o Good Design Award Chicago, o Red Dot, os European Design Awards, o IDA Design Award e o A’ Design Award.